"Rogo-vos, pois, eu, o preso do Senhor, que andeis como é digno da vocação com que fostes chamados,
Com toda a humildade e mansidão, com longanimidade, suportando-vos uns aos outros em amor,
Procurando guardar a unidade do Espírito pelo vínculo da paz.
Há um só corpo e um só Espírito, como também fostes chamados em uma só esperança da vossa vocação;
Um só Senhor, uma só fé, um só batismo;
Um só Deus e Pai de todos, o qual é sobre todos, e por todos e em todos vós."
Efésios 4:1-6

Catolicismo brasileiro

O Brasil é o maior país católico do mundo

Ultimamente, com a morte do papa, tenho lido esta frase em vários locais, e sempre minha mente, inconscientemente não aceitava bem esta “verdade”. Daí; com um pouco de calma, com os olhos focalizados no povo brasileiro e com o meu relacionamento com os ditos católicos, pude chegar a seguinte conclusão:
Para se compreender o que é ser católico no Brasil, temos de analisar os vários tipos que conhecemos e o que os padres consideram como católicos.
 A rigor, que eu me lembre, conheci uma pessoa que sabia realmente o que era ser católica: minha tia. Uma senhora beirando os seus oitenta anos. Ela sabia os significados das liturgias, um pouco da história de sua igreja e seus santos, era leitora assídua da Bíblia (muito mais que a grande maioria dos ditos evangélicos). Levava à sério a rotina das missas e o que os seus padres falavam nos sermões. No vulgar, ela era o que chamamos de uma “católica carola”. Quase todos os seus filhos haviam se convertido às várias denominações de linhas evangélicas. Resistiu com bravura aos assédios religiosos deles até o fim e morreu católica. Era uma boa mãe, boa esposa, boa gente mesmo! Creio que dona Maria, minha tia, foi salva. O quê? Falei asneira? E daí, se ela considerava uma outra personagem bíblica como mediadora entre ela e Deus? Será que ela era pior que Maria Madalena? Ou à mulher samaritana? Ou à Raabe a prostituta? Ou ao homicida e adúltero, David, ou aos mentirosos: Abraão e Pedro? Ou ao lascivo Salomão? E o que falar de Dimas, o ladrão “colega de cruz” de Jesus? Creio que foi salva, não por ter sido boa mãe, boa esposa, boa gente e uma “verdadeira católica”; mas porque amava o Mestre e tinha a devida fé nEle, e mais que isso, expressava na prática, todo o amor (não fingido), derramado em seu coração.
Tenho impressão que Deus terá de arrumar um outro “céu melhor” para algumas pessoas. Talvez um “céu do céu”. O céu de Cristo não comporta a “santidade” de muitos religiosos que conheço!
Outra categoria de católicos que conheçocompõe pessoas cultas e bem informadas; intelectuais. Vão à igreja com uma certa freqüência, prestam atenção aos sermões, cumprem os rituais e rezas, mas infelizmente ficam somente aí. Não se envolvem com nada. São as suas obrigações religiosas para com Deus e isso já basta para eles. Um belo exemplo disso é uma certa prima de minha mulher: formada em advocacia, mulher inteligente, grande leitora de bons livros (seculares, claro). Em sua cabeça, ela pensa: “nasci católica e vou morrer católica! É uma questão de tradição familiar”. Ano passado ela foi à Portugal, em Fátima - só para ver o “pinheirinho” onde Nossa Senhora “pairou”. Não sabe nada de Bíblia! Nenhuma passagem do Novo Testamento, nem o plano de salvação de Cristo, nem a Graça, nem a fé, nem nada, nenhum fundamento bíblico! Tenho impressão que a proíbem de ler a Bíblia; só pode! Não há nenhuma possibilidade de diálogo religioso com esse grupo. Desta categoria, com certeza, não conheci mais que vinte pessoas. Olhe que conheci muita gente em minha vida!
Outro grupo: pessoas que, para não dizer que são atéias (isso pega mal no Brasil), afirmam que são católicas. É a grande onda, ser católico no Brasil. Aqui, quem não é religioso e não gosta de futebol, é católico e torce pelo flamengo! Não acreditam em Deus, numa só palavra da Bíblia, não gostam de nenhuma religião, menosprezam qualquer tipo de ensino religioso, especialmente o dos “crentes”, mas nunca assumem que são incrédulos. Mentem até para as pesquisas de estatísticas, somente por conveniências sociais e econômicas. Esse grupo é grande! Seguramente não posso dizer a quantidade de pessoas desta categoria, que conheço. Tenho que dizer um número? Talvez umas quinhentas pessoas que conheci na vida.
Mais grupo? Aqueles que têm mais afinidades por outras religiões, mas por medo de serem discriminados, falam que são católicos! Por exemplo: os “espíritas enrustidos”. Acham uma maravilha a doutrina kardecista, - a de “primeira linha” - por acharem muito justa e honesta, mas, pensam eles, não vão levar nenhuma vantagem com isto. Os padres não os consideram católicos. Quantidade? É muita gente! Não posso dizer.
E o grupo dos sincréticos? Eles não sabem muito bem o que são, mas por via das dúvidas; são católicos! Combinam crenças do chamado: baixo espiritismo, com as crenças do catolicismo: Iemanjá é Nossa Senhora. São Jorge éoxum. Santa Bárbara é Iansã (se não me falha a memória). E assim por diante. Pensam que são católicos, mas os padres não os consideram. Esse grupo é enorme! Muito grande mesmo, principalmente no Rio de Janeiro, no nordeste e outras regiões. No último dia do ano e no dia dois de fevereiro, vemos milhões de pessoas pela televisão, nas praias a jogar flores para Iemanjá. São católicos! Missa? A grande maioria não sabe quando foi a última vez que pisou na igreja! Mas são católicos!
Agora é a vez de um grupo ainda maior: daqueles que não tiveram a sorte de nascer numa casa digna. São os miseráveis, ignorantes e analfabetos. Esses, não dão muita bola para o que os padres falam. Elegem quem quer para adorar. Não obedecem à lista dos beatificados por Roma. Aliás, o Brasil, por ter “tantos católicos”, só tem um santo oficial! Não nos querem para santos, somente para ovelhas! O Padre Cícero Gusmão no nordeste é intocável. Aí daquele que proibir suas devoções! São milhões de pessoas devotas deste falecido padre nordestino. Mas existem muitos outros “santos marginais”. Neste grupo, pela estatística, arrisco um palpite de quantidade: são em torno de 60% da população, o que dá mais ou menos 110 milhões de pessoas. Ano passado, numa determinada cidadezinha de São Paulo, limparam os vidros da janela de uma casa, com um determinado produto e vejam só! Apareceu Nossa Senhora desenhada no vidro! Coitado do proprietário; virou romaria a sua casa! Multidões se aglomeravam à sua porta. Fechavam a rua e até desconhecidos entrava porta à dentro! Não sabem no que crêem; qualquer coisa é objeto de adoração. Se aparece alguém dizendo que uma sandália velha foi de Cristo, pronto; está a começar mais uma romaria. Missa? A grande maioria não sabe quando foi a última vez que pisou na igreja! Mas são católicos!
Bom, agora vou falar de um grupo seleto de católicos: os próprios padres. Estudei numa faculdade católica, e posso dizer que conheci muito bem, alguns padres professores. Descobri que alguns me pareciam bastante sinceros. Eram homens cultos e muito convictos de seus credos. Mas em geral os outros não me pareciam religiosos. Na verdade eram bastante ateus! Não quero mencionar os maus exemplos dos padres, mas também não quero ser omisso. O que ouvimos dos católicos e o que vemos na mídia sobre esses sacerdotes me entristece muito. Não me escandaliza porque nada que venha do homem me surpreende mais. São estes, os que pregam sermões para o nosso povo. São nossos católicos!
E agora, será que posso dizer que somos o maior pais católico do mundo? Acho que devemos dar uma olhada lá fora, para descobrir como são os católicos de lá. Se forem iguais aos daqui, então poderei afirmar que de fato somos o maior. Caso contrário, temos de rever essa estatística.

David de Oliveira  -  Abril de 2005.